quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Peixarias da infância


Para algumas pessoas, peixaria é sinônimo de nojo e mau cheiro. Para mim traz lembranças boas – quando ia com meu vô e minha vó, ao mercado de Guaratuba. Enquanto a outra parte da família direcionava suas cadeirinhas, isopores e guarda-sóis para a praia, eu, o vô e a vó praticávamos a análise das guelras dos peixes, a rigidez dos camarões, o frescor dos mariscos.
Minha vó sentava nos degraus para comer ostras frescas, abertas na hora, fornecidas pelo pescador ainda no barco.
Cheiro de frutos do mar, para mim, é aroma da infância.
O passado – este antigo mercado que hoje nem existe mais.
É claro que havia outro interesse – comprar um gibi de super-heróis na banca da praça (a única da cidade) no caminho de volta.  Gibi que eu lia entre um picolé e outro, na praia, protegido pela sombra do guarda-sol da família.
Lá pelas 13h voltávamos para casa. Parte da galera mandava ver na cozinha, e outros (como eu) cheirávamos as panelas. De vez em quando me arriscava na limpeza de um ou outro peixe.
Terminava de ler o gibi na rede até a hora do almoço.
Depois o dia seguia na velocidade normal e na manhã seguinte lá estávamos novamente – eu, o vô e a vó, para mais uma aventura no mercado. Entre linguados, salmões, robalos, polvos, lulas, ostras e camarões fantásticos.
Eu – um mero piá de prédio curitibano. Empolgado com criaturas marinhas e faminto por gibis.
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Por isso resolvi desenhar uma peixaria do Mercado Municipal. Escolhi a Keli Mozer porque fica numa das esquinas e possui um ângulo mais interessante. Croquizei de pé, para conseguir ver melhor os detalhes, em virtude à aglomeração de clientes. Curiosos e compradores, disputando pacotes de seres oceânicos, selecionando um ou outro peixe, analisando os preços nas plaquinhas, solicitando pesagens, pagando & pegando as compras.  As crianças impressionadas com as imensas postas e tentáculos.
Gosto do desafio de registrar o intervalo de tempo, desenhando alguns personagens de memória. Condensar a tarde toda numa única imagem. Risoto de sketch com memória de avós, aroma marítimo e tempero de zumbido urbano.
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Medida: 18 x 26 cm
Técnica: nanquim, aquarela, POSCA, tinta acrílica & lápis de cor
Papel Arches 300 g/m² satinado


(Fabiano Vianna, 25/07/15)



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