sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Croquis Urbanos para mim

Rafael Pto

Desde que comecei a participar dos encontros semanais do “Croquis Urbanos”  – grupo que se encontra para desenhar a urbe, sinto-me mais vivo. É como se nanquim corresse em minhas veias e canetas brotassem de minhas mãos.
Desenhar é muito prazeroso.
Vivi durante muito tempo apenas ilustrando para clientes, muitas vezes em frente ao computador. Utilizando meu traço para resolver os “jobs” rotineiros. E estava infeliz (só) com eles por serem criações muito direcionadas.
No “Croquis”, redescobri um traço mais visceral, livre, solto. Voltei a experimentar grafismos e pintar com aquarela na rua. Sentir o cheiro da tinta e a textura dos papéis. A gramatura e consistência dos objetos voltaram a ser relevantes.
Algo que não fazia há muito tempo, desde a época que cursei Arquitetura e Urbanismo. Estar na rua – onde as histórias acontecem. Sujeito às dificuldades e alegrias de estar exposto. Clima, tempo, acontecimentos, surpresas... Malucos-beleza com visões duplicadas, travestis sedentos por desenhos safados, curiosos enigmáticos, cantores de praça, piás bisbilhoteiros, turistas interessados, alimentadores de pombos, fantasmas locais, senhoras fumantes, amantes inspirados, avôs, camelôs, ciclistas, escritores, floristas, mendigos, estudantes, cachorros, urubus e gatos citadinos.
Aliás, reencontrei antigos colegas do curso também. Depois de treze anos de formado.
Também conheci artistas fantásticos e entre eles, encontrei um mestre – José Marconi. Eu, que achava que não tinha mais idade para isto. Para viver experiências assistidas em filmes e/ou pertencer a um bando.
Relembrei ao lado destes colegas, conceitos de desenho de observação e proporção. Redescobri minha própria cidade. (Se ela realmente existe e não esteja diariamente sendo criada).
Das vezes que fomos desenhar “in loco”, mesmo de baixo de chuva, no manguezal (no caso da ida à Paranaguá) ou em condições difíceis.
Voltei a perceber Curitiba com olhos criativos (e não apenas através de um olho dispositivo de segurança – utilizado como ferramenta de combate). Todos os detalhes – cornijas, pilastras, peitoris, lambrequins, balaustradas.
Agora ando pelas ruas conjecturando temas a serem croquizados.
Desenhar para mim é como contar histórias. São crônicas gráficas, pois costumo inserir personagens cotidianos nelas.
Durante a semana, ainda faço trabalhos para clientes. Mas já divido meus horários com encomendas de pinturas e aquarelas pessoais. E estas novas criações, contrabalanceiam o stress do dia-a-dia. 
Há quem acredite que os encontros dominicais do grupo “Croquis Urbanos” só aconteçam em sonho. Uma espécie de delírio coletivo, orientado pela sugestão do evento no Facebook. Sonhamos que desenhamos. Ou é o contrário – sonhamos a rotina da semana e acordamos do transe aos domingos.


(Fabiano Vianna, 09/04/14)


terça-feira, 20 de janeiro de 2015

A croquizeira e o trem


Rubens Nemitz Jr

A croquizeira Giovanna Festa está nítida na excelente fotografia de Rubens Nemitz Jr. Concentrada e imóvel, frente a transitoriedade do movimento do trem/tempo. 

Enquanto o fotógrafo é capaz de registrar diversos segundos da passagem da locomotiva, a croquizeira só é capaz (geralmente) de um único desenho – mas que procura condensar (ou não) todo o período da manhã. 

Depois que o trem/tempo passa, resta o vazio. A locomotiva desaparece. Mas o croquizeiro não. E possuiu agora o desenho – que eu chamo de “uma infinita presença”. (F.V., 18/01/15)

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Sobre a imagem, o fotógrafo Rubens Nemitz Jr. escreveu:
Essa obra, em especial, foi a que exigiu maior precisão e percepção, e foi a primeira fotografia que fiz no domingo. Quando cheguei no Arquipélago, percebi o som do trem vindo lá dos cafundós. Busquei o melhor local, e fiz da árvore um monopé, necessário para essa longa exposição, a qual, tecnicamente à luz do dia, costuma ser o auge da complexidade (100mm, 1/15seg, f/18, ISO 100) quando não se tem à mão filtros de densidade neutra e outras "tintas para amenizar/ressaltar" foco e movimento. 
Embora a vermelhidão do trem cortando o túnel verde fosse predominante, enxerguei a cena toda em preto e branco; as cores dentro dos tons monocromáticos trouxeram o movimento à tona, dividiram o sol intenso das sombras, e o foco na artista seria meu punctum, receita a qual, aliada a nitidez que eu precisava, me traria a interação da tranquilidade humana presente num croquista, mesmo quando uma máquina mortífera avança correndo pelo metal quente. Foi este o objetivo desta obra, onde o "delicado som do trovão" soma àqueles que buscam utilizar sua luz.