quinta-feira, 5 de setembro de 2013

A Casa Estrela

Foto de Washington Takeuchi

Acho que fui um dos cinco primeiros a chegar, quando encontrei o professor Ivens Fontoura – um dos responsáveis, ao lado de Claudio Forte Maiolino, pela reconstrução da Casa Estrela na PUCPR.
Ivens me explicou que o nome da casa é uma referência ao formato da construção, cuja planta é baseada em uma estrela de cinco pontas. E que em cada ponta da casa, existe um continente.
Construída em 1930 pelo exímio contador Augusto Gonçalves de Castro, a casa foi moradia da família até os anos 90. Vivendo entre gigantescos arbustos de hortências e raios solares diagonais.
Adepto da Teosofia e Esperanto, Castro escolheu dar uma forma à casa que simbolizasse os ideais pacifistas e de unidade dos povos que estas duas correntes expressam. O contador levou aproximadamente quatro anos para concluir a construção. (Mas há quem diga que esticou até o quinto, esmerando-se na pintura, só para fazer sentido).
O trabalho foi desenvolvido com auxílio de ferramentas precárias e um lampião de carbureto, sempre após o expediente normal na empresa Macchine Cottons onde exercia a função de contador.
A casa ergueu-se sob a luz do carbureto.
E, refeita, mantém esta atmosfera. O sol escorre pelas linhas das tábuas e dorme embaixo da pequenina escada, no porão. Por isso que às vezes não dá as caras aos curitibanos.

Mario Freitas

Paco Steinberg

Há quem diga: “A cobertura é feia, esquisita e foi estruturada toscamente – na base da tentativa-e-erro”. Mas quando vejo de cima, apaixono-me sempre. Sinto vontade de colocá-la no bolso. Existe para mim, muita beleza na concepção inocente. O telhado multifacetado obscurece a tacanhice dos construtores metodistas mascarados. Não há regras quando o efêmero transforma-se em eterno, nem quando a candura rege a verdade.
A casa está segura, sob as asas da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e em nossa memória, ou seja, no tempo.
E se você captar o comentário “O carpinteiro deve ter improvisado”, responda que não existiu tal pessoa. Augusto construiu sozinho, munido apenas de uma serra de arco artesanal.
Ivens enumera-me uma quantidade incrível de personagens que fizeram parte da história da casa, e reforça que, conectados por linhas, formam inúmeros pentagramas sobrepostos.
Num deles está o automóvel marca Buick que Augusto trocou por um lote de madeira de pinho, vigas, vigotes, ripas e tábuas com 12 polegadas – ligado ao documento do alvará assinado pelo engenheiro Júlio Moreira, Diretor de Obras da Prefeitura de Curitiba.
Noutro, alfinetes com nomes dos teosóficos Pitágoras, Jakob Böhme, Helena Petrovna Blavatsky, Henry Steel Olcott e William Quan Judge. Justaposto ao traçado de um mapa do bairro Alto da Glória e interligado ao nome de Ludwik Lejzer Zamenhof – iniciador do Esperanto.
Em cada ponto em que as estrelas se tocam, cresceu uma árvore.
O Reitor Irmão Clemente Ivo Juliatto, que é um dos cinco que chegaram cedo, conta-me que o terreno da PUCPR onde a casa foi instalada era um espaço para mudas – das árvores a serem plantadas no campus. E que algumas raízes, depois de um tempo, ultrapassaram os pacotes e fixaram-se ao solo. O que me leva a pensar que elas queriam ficar ali, ou foram arquitetas e decididas dentro de um diagrama maior.

Paco Steinberg

Simon Taylor

Depois o dia correu no mais perfeito caos. Os croquiseiros chegaram, comemoramos seis meses de encontros ininterruptos e fizemos muitos desenhos. Muitos olhares e técnicas diferentes compuseram um panorama fantástico. E o sol, que mora no porão, se recolheu à tarde, abrindo caminho para uma tempestade fabulosa que rematou nossas atividades. (Por sorte Ivens trancou as aquarelas num baú).

Fabiano Vianna

Raquel Deliberali

Fabiano Vianna

Amir Samad Shafa

José Marconi

José Marconi

Dante Mendonça

Marina Luxi

Cassio Shimizu

Fabiano Vianna por Washington Takeuchi

E enquanto eu esperava um táxi no portão 1, contemplando a chuva, conversei com o guarda noturno da universidade, Diogo. Ele passa a noite toda acordado, na guarita. Ou caminhando durante aquele setor.  
Disse-me que algo paira sobre a Casa Estrela. Morcegos e Corujas sobrevoam o telhado todas as noites. As árvores movem-se ao contrário e sombras perambulam pelas pequenitas escadas.  E falou que, de vez em quando, no silêncio da madrugada, é possível ouvir a respiração ofegante de um homem trabalhando e o som de uma serra – cortando madeira.



(Fabiano Vianna, 02/09/13)